Eu sempre fui solitário. E tá tudo bem. Essa não é uma escrita sobre isso. Você não é meu psicólogo e não é algo com que me afete hoje em dia. É só que eu precisava contextualizar. Eu sou gay. Na época que tive essa certeza e revelação, era difícil. Eu era pré adolescente num meio machista e completamente hétero. Porém, eu era mais excluído ainda da minha comunidade por ser gordo naquela época. Bom, os anos passaram. Como, em pleno 2019 a gente arranja nossos parceiros?
- Através de aplicativos. - Disse Bernardo, meu melhor amigo.
Ele realmente me incentivou, disse que mudaria esse meu lado de me sentir sozinho. Que eu deveria experimentar, principalmente pra sair da minha zona de conforto.
Era uma sexta-feira e eu tinha tido um dia cansativo de trabalho. E tudo que eu queria era tomar um bom vinho e entreter minha mente com alguma bobajada. Pois tomei um bom banho quente, abri o meu vinho e fiquei sentado encarando meu telefone. Até que decidi baixar o Grindr. Demorou alguns minutos, minha internet estava lenta. Mas logo quando abri, com a excitação, fiz o meu perfil o mais rápido possível. Fui o mais honesto que dava. Admito que aquilo estava me divertindo. As opções que tinham eram muito 8 ou 80. Muitos homens exibindo seu físico impecável, muitos casados querendo sigilo e todo tipo de estereótipo. O divertido parou de me entreter e eu achei mais prazeroso assistir um pouco de Game of Thrones. A verdade é que quando acabou o episódio, eu ainda estava sem sono. Abri novamente um aplicativo e eu tinha a possibilidade de conversar com um rapaz que se intitulava como “Senhor G” eu pensei: por que não? E quando vi, já estava conversando com Senhor G mais de uma hora. Os gostos em comum, o como ele sempre sabia o que dizer. Cara, aquilo me prendeu. Não me preocupei nem um pouco com o fato que ele não tinha me mostrado seu rosto. Não entendi o fato dele ter só fotos de corpo, ele era mais que isso. Mas, estava sendo o suficiente.
~Perspectiva do Senhor G~
Eu não acreditava que estava mais uma vez perdendo tempo em aplicativos. Mas é que aquele cara realmente me chamou atenção. Alguma coisa nele me remetia a algo. Não sei o que, mas se prendeu minha atenção, é algo pra ser comentando. Bom, eu realmente não me interesso por afeminados, e tem uma história por trás disso. Quando criança, uns 11 anos, precisamente, não aceitava minha condição. E uma vez eu enganei um nerd que a escola toda sabia que era gay, pra me chupar. E quando entrou gente no banheiro eu simplesmente inventei que ele estava me assediando e que precisávamos dar uma lição nele. Veja bem, eu era popular. Em quem iriam acreditar? Quando vi, tinha mais de seis meninos em volta dele, agredindo-o com o que tinha. Eram coisas leves, eu não estava me sentindo culpado. O mais pesado era o que dava cintadas nas pernas dele. Mas de repente, eu me senti irado. MUITO irado. Como ele poderia ser tão bem resolvido? Tinha uma barra de ferro que estava ali de alguma coisa do banheiro. Não sei o que. Aquele banheiro nunca era de fato cuidado pelos serventes. Eu peguei aquela barra de ferro, ordenei que os meninos parassem, e descarreguei nele. Foi a única vez que dei uma coça em alguém. Mas tenho certeza que ele ficou bem marcado. Não só fisicamente, como psicologicamente.
Depois disso, a vida seguiu. Ninguém nunca descobriu, e no ano seguinte ele mudou de escola. Com 18 anos eu me aceitei, e aquele pensamento sobre esse menino parou de me assombrar. A culpa foi embora, sabe? A única coisa que fiquei em mente, que jamais ficaria com afeminados, porque ele era, e eu não queria ter trazer pro meu consciente a memória daquilo. Não esperava que eu fosse quebrar essa promessa, mas aconteceu. Conversei com aquele rapaz horas e horas. Até que precisei dormir, acordava cedo pros meus afazeres.
~Fim da perspectiva do Senhor G~
— Quatro semanas depois. —
Hilário era pra mim o fato que eu estava há quatro semanas conversando com alguém de aplicativo. Era divertida a troca de informações virtuais. Nunca recebi tanta indicação de música, nunca ri tanto. Eu já tinha o WhatsApp de Senhor G, mas ainda não sabia seu nome e nem tinha visto foto de seu rosto. Só que não podia julgar, minhas fotos não eram muito nítidas em relação as minhas feições. E admito que estava gostando dessa aventura.
Naquele sábado, Senhor G sumiu. O dia todo! E apareceu 1h da manhã me mandando mensagens sem sentido. No meio do papo, descobri que ele estava bêbado. Me disse que estava carente e iria me mostrar uma coisa.
Eu pensei comigo mesmo “mas já evoluímos pros nudes?” Não foi nada disso. Ele me mandou enfim uma foto de rosto, com a seguinte legenda. “Eu sou lindo. Eu sou lindo? Me dê biscoito!” Senhor G queria atenção. E depois de ver a foto dele, ele teria de fato a atenção que queria. Só respondi com a seguinte coisa:
“Parque do lago, daqui 30 minutos, encontro?”
~Perspectiva do Senhor G~
Uma galera da faculdade me chamou pra uma choppada. Era a mais esperada do ano. Então excitado com aquilo, eu fui. Chegando lá bebi todos os drinks possíveis. Até que percebi que faltava alguma coisa. Estranho, eu estava querendo ir pra casa conversar com o rapaz do aplicativo? Que ponto cheguei... Resolvi que escreveria pra ele. Sentei no único lugar vazio da festa, tirei uma foto minha e resolvi que queria atenção.
A resposta fez meu coração acelerar. “Parque do lago, daqui 30 minutos, encontro?” Aquele parque era quinze minutos de onde eu estava, eu iria a pé pra ver se adquiria sobriedade. Aproveitaria pra tomar uma coca-cola no caminho. E estaria ali antes dele que morava há cinco minutos do parque. Sai da festa o mais breve possível, e caminhei com passos largos. Como aquele parque era vazio, comprei minha coca no meio do caminho, antes que ficasse deserto. Até que finalmente cheguei, me sentei num balanço e aguardei. Consegui chegar faltando oito minutos pro combinado. Até que recebi uma mensagem “mudanças de planos, podemos nos encontrar em minha casa?” Como ele deixou o endereço e era perto, eu fui.
Realmente levaram os cinco minutos que eu esperava. Quando cheguei naquela casa amarela, eu respirei fundo pra bater na porta. Só que pra minha surpresa, ele abriu. Eu não estava pronto, não esperava, travei todo e fiquei observando. Ele logo quebrou o silêncio:
- Eu não mordo, só se pedir. Não vai entrar? - terminou de dizer.
Até que eu reparei. Mesmo tendo ficado um tempo olhando pra ele, não notei que ele usava uma máscara idêntica ao logo do aplicativo que nos conhecemos. Tive que comentar sobre isso.
- Irado você usar máscara. Mesmo que parte de mim queira ver seu rosto direito já que as fotos eram embaçadas. - Ri depois disso pra disfarçar, não poderia cobrar visto que eu mesmo enrolei pra me mostrar. Bom, eu saí entrando na casa dele. Sabia que ele retiraria aquela máscara depois do comentário. Estava enganado. Ele só fechou a porta pela qual entrei, perguntou se eu bebia Whisky. Não queria parecer mal educado, então aceitei. Ele disse que iria me servir e fiquei sozinho esperando ele naquela sala. Sentei no sofá, era de um vermelho vivo. O engraçado que toda decoração eram de cores bem vividas. Não sei se era o pouco efeito daquela bebida que consumi na festa, mas aquilo realmente me distraiu. Até que ele chegou com as bebidas. Dei o primeiro gole e resolvi puxar assunto:
- Então, estamos aqui finalmente, mas eu não sei seu nome. -
- Me chame de Miller.
Fiquei o encarando. Queria ver melhor suas expressões sem aquela máscara. Mas não sabia como dizer isso. Logo meus pensamentos foram interrompidos por outra fala:
- Então, Senhor G, o que você diria que foi mais importante na sua história de vida?
Aquela pergunta me pegou de surpresa, eu precisava de outra dose de Whisky pra responder, porque precisava pensar no que contar pra impacta-lo e parecer interessante. Mas quando iria justamente pedir outra dose, me senti estranho. Aquela sala girava. E as cores que antes eram vividas, pareciam que estavam se apagando. Eu balbuciei algo como “eu me sinto mal” e juro, eu ouvi ele dar uma gargalhada.
~Fim da perspectiva do Senhor G~
Eu mudei de ideia. Achei que a situação de me encontrar em um parque deserto no primeiro encontro, não passava segurança. Senhor G não assistiu as séries mais recentes? Resolvi sugerir na minha casa por ser relativamente perto da delegacia de polícia. Passaria uma certa segurança. Não é que ele topou? Divertido. Então eu preparei tudo que precisava pra aquele encontro. Me preparei bastante.
Fiquei vigiando pelo olho mágico da porta pra quando ele chegaria. E a cara que ele fez quando abri a porta antes mesmo dele bater, foi impagável. Precisei quebrar o gelo:
- Eu não mordo, só se pedir. Não vai entrar?
Quando ele respondeu sobre tirar a máscara só pensei “não, meu bem. não mesmo” então eu precisava entretê-lo. Quando fechei a porta com força, já com certeza tirei ele dos seus pensamentos. Ofereci bebida pra poder deixá-lo sozinho por um tempo e ver se familiarizava-se com meu ambiente. Quando ele aceitou, corri pra preparar. Bom, não tem muito segredo. Eis os ingredientes:
/ Um copo próprio para o Whisky.
/ Gelo.
/ Whisky.
/ Um líquido especial que chamarei de “breve apagada”
Não é que tá pronto? Fui entregar. Me surpreendi quando ele puxou conversa perguntando meu nome. Afinal, ele parecia estar bem nervoso. Respondi meu sobrenome. Era o mais sensato. Então decidi que estava na hora de começar a esquentar as coisas. Foi quando perguntei:
- Então, Senhor G, o que você diria que foi mais importante na sua história de vida?
Eu vi que meu líquido especial estava começando a fazer efeito. Ele parecia confuso e não muito estável. Quando disse que não se sentia bem, acabei gargalhando. Isso chamou um pouco a atenção dele, que se desequilibrou do sofá e acabou sentando no chão, me olhando confuso. Antes que ele falasse alguma coisa, era meu momento. Dei um soco em sua boca e ele ficou sem entender nada. O sangue escorrendo. Me empolguei e acabei dando socos até ele apagar. Acho que fui mais rápido que o que ele tomou. Com ele apagado, começaria a diversão. Consegui arrasta-lo até a cadeira mais próxima e o coloquei sentado com um pouco de dificuldade. Era incrível como seu corpo estava pesado. Ele estava sentado torto, mas consegui amarra-lo. O despi antes disso. Resolvi amordaça-lo também. Nada como um bom monótono. Ele não tinha o que dizer. Bom, eu não sabia em que momento ele acordaria, resolvi ligar o rádio que ficava na cozinha. Caralho, quando começou a tocar Welcome To The 60's do John Travolta, cresceu em mim um ânimo maior ainda. Eu não podia esperar. Enchi dois baldes de água fria. E joguei um de cada vez no meu querido dorminhoco. Ele acordou, sobressaltado. Eu fiquei falante:
- Sabe, quando te perguntei do dia mais importante da sua vida, eu pensei no meu. Sabe qual foi? - Eu disse isso enquanto tirava minha camiseta. - Bom, você não pode responder, mas eu posso. Foi aos meus onze anos. Quando finalmente o menino que eu era apaixonado me notou. Mesmo que fosse só de uma forma sexual. Ele me notou! Era tudo que eu precisava. Sabe o que ficou de lembrança de ter sido notado? - Mostrei pra ele as marcas que tinha pelo menos pelas costas, da coça que levei. As piores eram nas pernas e eu não estava pronto pra mostrar. Era divertido ver a cara dele, o olhar preocupado e arregalado. - Bom, eu não preciso dizer muita coisa, não é mesmo? Não mais. Pode não ter me reconhecido nem nas fotos embaçadas, nem muito menos pessoalmente. - Ri e apontei pra máscara- Eu nunca fui importante. Porra, realmente não lembrava meu sobrenome? Augusto Miller deveria ser um nome importante pra você. Só que quem bate, esquece. Quem apanha, nunca. -
Interrompi minha fala e peguei a maior faca que encontrei na cozinha. Nessas horas nunca fui tão feliz de colecionar esse tipo de coisa. Quando voltei, olhei pra ele e disse:
- John Travolta era seu cantor favorito. Ironicamente, é o meu também. Vamos nos divertir ao som de You Set My Dreams To Music? - Ele balançava a cabeça negativamente sem parar, e chorava copiosamente. E eu continuei: - Que falta de educação a sua, negando diversão. - Fui esfregando minha faca pelo seu corpo. Até chegar em seu pênis. - Cresceu bastante desde a última vez que coloquei a boca aqui, ein? - Deslizei a faca pelo seu membro, até que sem cerimônias, arranquei. Ele fazia uns barulhos divertidos, devido sua boca estar tampada. O desespero nele me dava satisfação. Bom, o que eu vou fazer a seguir não era plano, mas eu te digo, por que não? Tirei a mordaça dele. E ele só dizia “me perdoa, me perdoa, a gente precisa conversar” e eu só dei um soco em seu nariz e em seguida soquei seu membro em sua boca. E fui breve: - Mastiga ou eu te mato agora. - Ele engasgou e tentou pronunciar algumas palavras. Desocupei a boca dele pra escutar. Simplesmente disse que não faria, pois morreria da mesma forma. Senti ira. Coloquei a mordaça de volta e disse: - Você cometeu um grande erro. Morrer é uma realidade, mas já pensou o quanto isso pode ser demorado? - Fui de volta à cozinha e arranjei um alicate. Resolvi que seria divertido arrancar todas as suas unhas com aquilo. Eu fiz. Também havia buscado ácido, joguei em seu rosto. Ficou atraente até deformado. Divertido. Aquilo estava me cansando. Eu não tinha uma arma, como o mataria? Bom, eu sempre gostei de saunas. Escaldado parecia certo. Eu o deixei sozinho pela última vez e fui preparar seu banho.
~Perspectiva do Senhor G~
Quando me desequilibrei e cai do sofá, eu não imaginava o soco que ganharia. Eu já estava fraco, isso fez com que eu apagasse. Tudo era tão escuro, tão intensamente escuro. Eu não sei quanto tempo se passou. Só sei que eu acordei molhado. Desesperado. Ouvindo meu cantor favorito. E bem, isso não me acalmou. Tudo que Miller dizia, parecia distante. Tudo parecia distante até finalmente começar a ser torturado. Apesar da dor, do desespero, de chorar e toda essa reação humana, eu me desliguei. Senti que saí do meu corpo. Não tinha mais esperanças pra mim. O ponto final foi quando ele tentou fazer com que eu mastigasse meu órgão. Dali em diante, aceitei meu destino. Tudo que aconteceu depois, parecia cada vez mais distante e só me lembro de ouvir a água escorrer. Aquele maldito barulho de água que seria o meu fim. Quando ele me buscou pra me arrastar ao banheiro, me deu vontade de rir. Ele sempre foi tão fraco fisicamente e veja, eu não tenho forças psicológicas pra lutar. Eu aceitei. Só é divertido que ele continua com o mesmo tipo físico, só que emagreceu bruscamente. E as feições, cara, eu realmente não consigo associar ele aquela criança de onze anos que ele um dia foi.
Eu interrompi meu pensamento com aquela sensação de ardor, ardor, ardor. Sufocamento, sufocamento, sufocamento.
Em algum momento, eu não era mais eu. Eu simplesmente parei de existir. E isso deu final aquele ciclo. Aquele maldito ciclo.
~ Fim da perspectiva do Senhor G~
E apesar daquele sofrimento físico, Senhor G foi em paz. Toda a culpa voltou quando Miller se revelou pela primeira vez. Ele achava que merecia aquilo.
Miller não se sentiu realizado como gostaria. Tirou sua máscara e bebeu duas garrafas de água sanitária e isso funcionou para que seu suicídio funcionasse. A única coisa que Miller pensava enquanto apagava, é que se existisse um outro lado, ele realmente queria encontrar Senhor G lá. Já que não terminou satisfeito em vida, quem sabe na morte ache as soluções que tanto procurava?
Esperança boba a de Miller. O inferno é aqui. Não do lado de lá.
Autora: Mars Anjos