23/05/2019

Hey Daddy

 – Conte-nos como tudo aconteceu. Do começo.

 – Do começo… Bom, vou ter que falar sobre 23 de setembro.

23 de Setembro é o aniversário de minha filha. Eu estava terminando meu turno no
trabalho – mais ou menos umas 18:30h – e precisava correr para conseguir um presente para
ela. Como eu trabalhava em uma construção no centro da cidade, tinha fé que conseguiria
achar alguma loja de brinquedos aberta para comprar uma lembrancinha.

Andei por pelo menos 30 minutos pelas lojas próximas ao metrô. Para minha surpresa,
um presente de aniversário descente custava bem acima do que um pobre homem como eu
poderia pagar. Mas, como sempre, há uma luz no fim do túnel – ou, pelo menos, era o que eu
achava –, e eu ainda sim consegui comprar um presente: uma boneca.

Próximo a uma esquina, havia um desses vendedores abulantes, dos quais as ruas
normalmente são cheias. Ele já estava desmontando sua barraca, mas ainda era possível
visualizar diversas das suas bugigangas e, dentre elas, pude observar uma linda boneca.

Mesmo não sendo um desses brinquedos supermodernos, eu imaginava que filha fosse gostar.
Era uma boneca de madeira, vestindo trajes similares aos de festas juninas ou algo do tipo.
Paguei uma pechincha por ela, R$10,00. Tinha feito um negócio perfeito.

Peguei o metrô e depois um ônibus para casa. Consegui chegar a tempo dos parabéns e
pude entregar o meu presente para minha filha. Ela adorou, muito por sinal. Eu achei estranho
ela ter gostado tanto da boneca ao ponto que, deixava outros brinquedos que ela havia
ganhado de lado. Minha esposa me disse que talvez fosse pelo fato de ter sido eu a dar o
presente e isso ter gerado algum valor sentimental sobre o mesmo.

Naquela mesma noite, antes de dormir, algo me chamou atenção. Quando coloquei
minha filha para dormir, eu percebi que a boneca fazia um barulho. Toda vez que a barriga
dela era apertada, ela dizia a frase: “Hey Daddy”. Achei engraçado e interessante –
principalmente pelo fato de ter pago tão pouco por ela. Mesmo assim, deixei isso de lado e fui
dormir.

Foi ai que os problemas começaram. Durante toda a noite eu ouvia um ruido baixo e
distante se repetindo constantemente de maneira aleatória. Prestando mais atenção, eu percebi
que o barulho vinha da boneca. Imaginei que minha filha pudesse ter dormido abraçada com
ela e que, por isso, o sensor ficava ativado. Preferi não mexer com minha filha aquela hora da
noite, imaginei que logo, logo as baterias do brinquedo fossem acabar e tudo ficaria bem. Mas
não ficou.

Pelos próximos três dias eu tive que ouvir aquele ruído durante toda a noite. Foi
quando decidi chamar a atenção de minha filha, pedindo para que ela não dormisse abraçada
com a boneca. Expliquei dizendo que não conseguia dormir por conta do barulho que ela
fazia. Minha esposa retrucou, ela disse que nunca tinha ouvido barulho algum e que eu estava
exagerando.

Mais dias se passaram, pelo menos duas semanas eu acho. E eu já não conseguia
dormir. Meu rendimento no trabalho já estava sendo afetado e eu começava a me preocupar
com isso. Agora além da noite, a boneca ficava fazendo barulho durante o dia também. Minha
filha corria a casa inteira abraçada com ela e, em todos os cômodos, eu conseguia ser
incomodado por aquele som irritante.

“Hey daddy”

“Hey daddy”

“Hey daddy”

Um pouco mais de um mês tinha se passado e eu já havia levado bronca no trabalho.
Em um dia desses eu acabei descendo cinco paradas depois da minha por ter dormido no
ônibus. Não dava mais, eu precisava agir de alguma forma ou ficaria louco.
Conversei com minha mulher para que doássemos a boneca para alguém ou somente
jogasse ela fora. Recebi uma bronca, ela disse que eu estava exagerando, que não via
problema algum com o brinquedo e que não teria coragem que de tirá-lo de minha filha já que
ela nuca desgrudava dele.

Eu estava sozinho, à ponto de enlouquecer. Não dormia a dois meses, já estava a ponto
de ser demitido, mal conseguia raciocinar direito e nem a minha própria esposa conseguia me
entender. Era angustiante, noite e dia, dia e noite, e aquele barulho infernal enfestando a
minha cabeça, como um enxame. Eu podia jurar que tinha ficado mais alto aquela altura.
Naquela semana eu recebi um dia de folga. Meu chefe achou que pudesse me ajudar.
Estava na garagem procurando alguns isoladores de som, algo que eu costumava usar em uma
antiga construção em que trabalhei. Mesmo na garagem, fora de casa, eu podia ouvir aquele
barulho. Mais alto e intenso que nunca, não aguentava mais.

“HEY DADDY”

“HEY DADDY”

“HEY DADDY”

CHEGA!

Peguei o machado que estava pendurado na parede a minha frente e, furioso, caminhei
até o quarto da minha filha. Subi as escadas rápido e firme. Sentia o suor frio passando pelos
meus braços e se acumulando em minhas mãos que seguravam agressivamente o machado.
Entrei pela porta e pude ver o cabelo loiro daquela boneca maldita. Sem pensar duas
vezes, eu cravei o machado na cabeça dela. Senti meu corpo quente, vivo e agitado, quase
como se tivesse tido um orgasmo naquele momento. Entretanto, naquele instante eu ouvi uma
voz de espanto atrás de mim; era minha filha. Tentei tirar o machado da cabeça da boneca,
mas estava preso. Coloquei mais força e, na hora que consegui tirar o machado, minha filha
veio atrás de mim e, sem querer, o machado a acertou. Acertou com tanta força que ela foi
jogada para canto do quarto.

Eu estava nervoso, não sabia o que fazer. Passei pelo menos uma hora caminhando de
um lado para o outro, observando tanto o corpo de minha filha, quanto o da boneca. Após
pensar bastante, tomei a decisão que me trouxe até aqui.

Lembrei que, no quintal de minha casa, havia uma velha casa de cachorro que nunca
havia sido usada. Era grande e normalmente servia como casinha de brinquedo para minha
filha. Fui até a garagem novamente e peguei alguns materiais. Rapidamente eu quebrei o piso
da casinha, cavei uma cova e enterrei minha filha e a boneca. Cobri de terra e depois com uma
base de cimento. Consegui deixar o máximo possível parecido como antes e segui para o
quarto de minha filha. De maneira quase incrível, o quarto não havia se sujado tanto de
sangue, mesmo com uma pancada tão violenta.

Era 17:00h, foi quando minha esposa chegou em casa. Mostrei-me demasiado
preocupado, dizendo a ela que nossa filha havia sumido. Procuramos por toda a rua, nas casas
das amigas e até no bosque próximo a nossa rua. Obviamente, não encontramos nada.
Decidimos então chamar a polícia.

As 20:45, os policiais já haviam tomado nossos depoimentos e feito algumas buscas
pela casa. Pediram fotos e disseram que começariam algumas buscas. Passaram pelo menos
mais três semanas procurando ela e nada. Foi quando suspeitaram que algo pudesse ter
acontecido dentro de nossa casa. Fizeram mais investigações na casa, mas não acharam nada
que pudesse me incriminar de fato, eu havia limpado tudo e me livrado do machado, estava
tudo indo muito bem.

Eles já haviam terminado seu trabalho e eu já tinha fé que tudo ocorreria bem dali para
frente. Eu voltaria a dormir e a trabalhar, consolaria minha esposa e possivelmente teríamos
outra filha alguns anos depois. Mas foi nesse momento, enquanto caminhávamos até o portão,
que o policial olhou para o lado e perguntou: “O que é aquilo?”.

Era a casa do cachorro. Respondi a ele e reforcei que não usávamos ela. Entretanto,
minha esposa comentou o fato de nossa filha brincar lá de vez em quando. Os policiais
decidiram dar uma olhada, para ver se achavam alguma pista. Eu ainda me mantinha calmo,
tinha feito um buraco bem fundo e um piso grosso com bastante cimento.

Eles olharam a casinha e nada. Tudo certo, já podiam ir embora. Foi quando, para a
surpresa de todos e, principalmente, para a minha desgraça. Ecoou pela velha casinha de
madeira, atravessando aquele buraco fundo, a cobertura de cimento e me dando calafrios por
todo o corpo. Aquele som maldito:

“Hey daddy!”

– Tendo em vista as provas e a confissão, condeno

Autor: le_leprechaun_
Inspirado na Obra "O Gato Preto", de Edgar Alan Poe

30 comentários:

  1. Tem uns dois contos do Edgar Alan Poe parecidos com esse...

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    1. Sim, são eles o "O gato preto" e também "coração delator".

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    2. Também me lembrou o Põe. Isso tornou o final previsível.

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    3. Então, fui eu quem escreveu esse conto e, sim, ele foi inspirado no conto "O gato preto" do Poe. Na verdade, eu costumo colocar uma nota no início do texto, informando isso. Infelizmente, nesse caso, o arquivo que eu enviei não tinha essa nota. A ideia era homenagear o Egdar e esse conto que eu gosto muito, dando uma cara nova pra ele. A intensão não era, de forma alguma, plagiá-lo.

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  2. Legal, só não gostei das emoções da creepy sabe? O cara nem teve remorso, uma pessoa normal ficaria louca por matar a própria filha e um assassino ficaria feliz esultante, não senti nenhuma dessas coisas na creepy
    7/10

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    1. Vc criticou a creepy e deu um 7 kkkkkkk

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    2. Obrigado pelo comentário. Então, o objetivo era realmente deixar essa imagem de psicopata para o pai. Algo que teria sido causado pela influência maligna da boneca sobre ele.

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  3. Como o cara disse lá em cima, creepy quase idêntica ao conto "o gato preto" do Edgar Allan Poe

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    1. A ideia era ser uma homenagem ao conto do Poe. Era pra haver uma nota no início do texto informando isso mas, o arquivo que eu enviei para o site, infelizmente não tinha. Meu objetivo, não era, de forma alguma, plagiar ele.

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Bem legalzinha, adoro essas boneca endemonhada kakakaka 😁 o pai devia ser psicopata p/ matar a menininha e nao sentir nada! 10/10 😘 🎃

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    1. Obrigado pelo comentário e pela nota. Sim, a ideia era dar essa cara de psicopata para o pai, que ficou maluco por causa da influência maligna da boneca.

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  6. Divina tá fazendo falta... Não que essa creppy tenha ficado ruim, apenas pq o site tá com menos publicações depois que ela entrou de resguardo.

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    1. Ela teve um bebê esses dias, recem nascido ainda então ta sem tempo pro site.. mas ela disse q quer voltar em breve 😻

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  7. PRGDL02022

    Gostei. Na parte que ele fala a respeito das baterias, achei que quando ele fosse retirar as pilhas da boneca, não ia achar nenhum compartimento, ou que se tivesse ao abri-lo, iria ver os órgãos internos da boneca.

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  8. kralho creepy de uma em uma semana, aqui é o melhor lugar pra ler em portugues,mas infelizmente so postam a cada uma semana porra

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  9. Ola meus amigos amantes do terror, venho por meio deste comentario convidar-lhes para um grupo do whatsapp voltado para o terror, caso tenha interesse meu numero é +554391603004, basta falar que quer entrar no grupo

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  10. Este comentário foi removido pelo autor.

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  11. Este comentário foi removido pelo autor.

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  12. Só pelo fato de ter uma boneca envolvida na história, eu já gostei pra caralho, porém as emoções do personagem são totalmente desprezíveis, ele não sentiu remorso nem nada do tipo, mas enfim, creepy muito boa.

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