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Criaturas
inteligentes, quem lhes conduz?
Em eterna ignorância,
interesse e desdém.
Correm para a Luz,
correm para a Luz.
Mas pertencem a mim
também.
Adianto que esta é uma história
sobre o inverso. Nada, absolutamente nada, pode existir sem o seu oposto.
Considere essa uma autobiografia do Mal.
“É possível que eu tenha passado
longos anos sem saber que existia. Tudo era escuridão para mim. Um mero expectador
de nada, sem corpo e sem companhia. Quando os primeiros vislumbres da luz
começaram a surgir por toda parte tomando formas gigantescas que nasciam e
morriam em instantes, ajustando-se em grandes espetáculos de fogo, eu observava
tudo aquilo sem saber o que pensar ou entender. Os planetas e seus satélites,
as estrelas, as galáxias, a matéria invisível até para mim que mantém todas as
coisas unidas pelo campo gravitacional. Tudo isso acontecia bem diante de mim.
Um Universo calmo, escuro, agora perturbado pela atraente beleza da Luz.
Minha consciência pareceu
despertar quando os corpos celestes esfriaram, formaram seus rios e mares e a
primeira centelha de vida começou a despertar nos cantos mais improváveis do
Universo. Criaturas rastejantes que se transformavam e caçavam criaturas
menores do que elas. Não faziam nada demais. A vida delas era só matar, copular
e morrer.
Observar tudo aquilo foi
espetacular, é claro. Naquela época, eu não tinha nenhuma noção de existência
ainda. Eu me divertia simplesmente vendo os planetas que podiam abrigar vida se
transformando e as espécies em evolução cobrindo seu terreno, dominando
continentes inteiros, encontrando seus predadores naturais. Maravilhado, eu
pude ver o quanto as criaturas se esforçavam para ficarem maiores e melhores em
matar umas às outras. Não demorava muito até que uma grande inovação biológica
como olhos sensíveis à luz, um pescoço mais alongado, presas curvas ou asas
pudessem lançar certos animais ao topo da cadeia alimentar e garantirem a
permanência de sua espécie em seu habitat.
Foi observando aquele ciclo
interminável de caça, cópula e morte que eu pude perceber que, muito embora as
criaturas tivessem um tempo limitado, eu permanecia atemporal. Não precisava
comer, copular ou matar. Eu estava livre dos grilhões da vida, apenas
assistindo aquela história sem sentido de criaturas programadas para repetirem
o mesmo ciclo de novo e de novo. Não havia paixão naquilo. Elas simplesmente
faziam o que suas necessidades naturais mandavam fazer. No entanto, todas elas
possuíam uma origem primordial, um ponto em comum. Era óbvio para um ser tão
antigo como eu: a Luz.
Foi a Luz que deu origem a todas
aquelas criaturas. Eu sabia que eu não havia sido gerado pela Luz, pois eu
estava lá antes da Luz existir. Aquilo me transtornou muito e por eras eu me
ressenti enormemente pela incógnita que orbitava minha existência. Será que eu
existia de fato? Eu me perguntava isso. Todas as criaturas pareciam nascer,
crescer, se reproduzir e morrer. Eu não. O que isso significava para mim além
de que eu estava apenas morto?
Até que nesse planeta vi surgir
uma espécie nova, mais inteligente. Eu via sua engenhosidade, seu cérebro
trabalhando para superar as desvantagens de seu corpo fragilizado e o ambiente
hostil à sua volta, recheados de predadores maiores e mais fortes. Via como
essa criatura, aos poucos, conquistava seu lugar primário na cadeia alimentar
graças a sua inteligência ainda em formação. Mesmo que ainda fosse igual às
outras criaturas, buscando seu espaço para nascer, crescer, se multiplicar e
morrer, aquilo era novidade. Tanta novidade que um dia eu decidi
cumprimentá-la, conhecê-la de qualquer forma. E então eu me revelei.
A primeira vez que fiz isso,
apenas sussurrei no ouvido da nova criatura, um mero macaco remexendo em ossos
e pedras. Aconteceu algo inesperado, no entanto. A criatura pareceu não ser
capaz de me ver, mas eu havia desencadeado algo nela com as minhas palavras. Um
sentimento, uma nova descoberta que destrancava áreas não visitadas de seu
cérebro primitivo. A criatura contou de mim para os outros, inventou histórias
fantásticas a meu respeito e logo foi coroado como o líder daquele lugar entre
seus iguais. Fiquei surpreso pelo deslinde da situação. Mais surpreso ainda ao
ver o quanto o poder da criatura havia lhe subido a cabeça, tornando-o um líder
tirano, levando-o a seu assassinato e a uma guerra de facções, culminando na
destruição daquele povo, jogando-os na escuridão.
E o culpado era eu mesmo. Eu
havia corrompido a Luz daquela criatura. Foi a primeira vez que eu percebi que
se a Luz havia concebido aqueles seres, eu havia lhes apresentado as Trevas. Um
desvio da finalidade evolutiva de uma espécie inteira.
Minha marca no mundo estava
lançada a partir daquele dia. Uma corrupção que transformava aqueles seres e os
faziam cometer atos estranhos e jamais vistos. Eles amavam, odiavam, faziam
amizades, coletavam rivalidades, cobiçavam, invejavam, adoravam. A corrente que
mantinha aquela espécie unida unicamente para seu próprio bem estava ameaçada
pelos sentimentos novos que eu despertava sorrateiramente, mas isso não era uma
má notícia. Nunca! Foi com alegria que eu percebi que, na verdade, a Luz não
era a resposta suficiente para o avanço da vida. Eu também era. A minha
influência e perversidade eram algo que dava a essas criaturas um predador a
mais para se preocuparem: elas mesmas. Seu ciclo evolutivo começou a funcionar
novamente, correr contra o tempo para se aperfeiçoar cada vez mais.
Eu havia, enfim, encontrado meu
propósito. A Corrupção, as Trevas. A contraparte da Luz. Não um inimigo a ser
destruído e evitado, mas uma parte vital na evolução da vida, um equilíbrio, um
princípio universal para a harmonia do Universo. Se a Luz era Amor, eu era o
Ódio. Se a Luz era o Afeto, eu era a Rivalidade. Sem mim, toda vida inteligente
ficaria presa em um status de conforto e ignorância eterna. O incrível motor do
Universo e suas infinitas possibilidades estariam congelados para sempre.
Foi o que eu fiz desde então.
Corrompi toda vida inteligente com Trevas. Sou o seu Deus, assim como o
responsável pela Luz.
Não demorou muito e outros seres
sem propósito, de alguma dimensão solitária, começaram a nascer e buscar
conforto nas religiões e crenças místicas dos povos humanos que cobriam a
Terra. Eu estava lá a tempo demais para ser iludido feito eles, para não saber
ao certo quem eu era. Essas entidades brincavam de deuses à vontade,
interpretavam seus papéis de bons ou maus e alguns até conseguiam assombrar
fisicamente aquelas criaturas. Meros reflexos de alguma outra dimensão perdida
no cruel desinteresse do Universo. Entretanto, até essas entidades novas e sem
propósito pareciam sentir minha presença, criar teorias ao meu respeito e a
minha contraparte. Eu me maravilhei com elas igualmente, pois eu sabia que sem
minha corrupção elas jamais encontrariam o sentido de suas vidas. Jamais
existiriam.
Os humanos e seus deuses.
Muito prazer, eu sou o Senhor da
Corrupção.
E sou o seu Deus”.
Autor: Marco Carvalho (Parabéns!)
Revisão: Gabriela Prado
Sério? Nenhum comentário.nenhum tom de comédia sobre política ?
ResponderExcluirLegal o texto, mas n é bem uma creepypasta.
ResponderExcluirNão é o Diabo, o Diabo veio depois da luz e ele veio de algum lugar, esse narrador é Deus mesmo, tanto que ele se compara aos outros deuses e se impõe como o maior. Deus nos corrompeu, ele nos apresentou às Trevas
ResponderExcluirUma creepy malteísta, simplificando. Uma teoria teológica bem incomum, mas interessante, crer que Deus é uma entidade maligna
ExcluirCreepy foda
ResponderExcluirPessoal liga corrupção somente a política
ResponderExcluirCorrupção, no sentido de corromper, pessoas corruptíveis... Suscetíveis ao mau
Creepy maravilhosa! Parabéns Marco Carvalho!
ResponderExcluirAchei muito boa e bem escrita! Parabéns!
ResponderExcluirUAU!
ResponderExcluirCaramba, que creepy! Gosti, além de ser muito bem escrita, diferenciou-se na questão do deus bom. Parabéns ao autor pela creepy!
ResponderExcluirAmei demais ♡
ResponderExcluirnossa