04/02/2017

Apenas uma picada de inseto

A minha mãe disse ter sido picada por algo há uma semana 

Ela queixou-se da dificuldade para respirar e disse que não conseguia sentir seu lado esquerdo, do meio para baixo. Para provar, ela nos mostrou a sua coxa esquerda. E claro, havia uma grande parte inflamada. Parecia consequência de uma picada de mosquito, só que estava muito maior. 

Pensamos que uma aranha pudesse tê-la mordido enquanto dormia, mas, como quase uma semana já havia se passado, e não éramos exatamente ricos, decidimos não atender aos pedidos dela para irmos ao hospital. Não poderíamos gastar com algo que provavelmente desapareceria em alguns dias. Estávamos certos de que desapareceria, afinal, era apenas uma picada de inseto... 

Esse foi o nosso erro. 

Quando acordamos hoje, a minha mãe estava chorando. Ela disse que a sensação de dormência tinha sido substituída por uma ardência torturante. Ela também estava com dificuldades para respirar. Inspecionamos sua coxa e nos assustamos ao descobrir que a grande picada de inseto estava aberta. A única parte inflamada havia se transformado em vários caroços inflamados que soltavam pus. Ela disse que queimavam. E certamente acreditamos nela. 

Era hora de irmos ao hospital. Meu pai disse que a levaria para a clínica mais próxima. Eu, por minha vez, fui para minhas aulas de verão. A condição assustadora da minha mãe dançava em algum lugar da minha mente, mas não dei muita atenção para isso. Minhas aulas estavam acabando, os exames finais se aproximavam, meus amigos planejavam uma viagem para a praia, e uma pequena dor em meus pulmões me incomodava. Esperava não estar ficando resfriado. 

Eu estava dirigindo para casa quando recebi a ligação. 

Era o meu pai. Ele estava histérico. Aparentemente, o médico que examinou a minha mãe, ordenou para que ela fosse levada para a emergência. Então meus pais seguiram para a emergência e esperaram, esperaram, e esperaram um pouco mais. Finalmente, minha mãe pôde ver o médico. Foi quando tudo desandou. Ele deu uma olhada em minha mãe, e saiu. Meus pais foram deixados na sala, confusos, quando as enfermeiras entraram. 

Algumas coletaram sangue da minha mãe, outras tiraram o meu pai da sala, ignorando suas perguntas e mandando-o aguardar na sala de espera. Ele aguardou, mas enquanto estava lá, teve tempo de ver uma dúzia de policiais entrarem no hospital, passarem pela sala de espera, e seguirem na direção da sala onde mantinham a minha mãe. Ele me contou essa última parte com um soluço sufocado: ele ouviu tiros. 

Foi quando o ouvi gritar. 

Isso me fez pular no assento do carro, minhas mãos tensas e brancas agarradas ao volante e meus olhos arregalados. Percebi que não estava respirando. No outro lado da linha, pude ouvir algo caindo. Provavelmente o celular caindo no chão. Então ouvi vozes discutindo, gritando autoritárias. Havia uma voz chorosa: meu pai. Era a primeira vez que eu o ouvia desse jeito – chorando por algo. Serei honesto… eu estava enojado. Não estava acostumado com um pai tão fraco. Eu costumava ser um homem de aço com um pai que me inspirava. Acho que eu estava confuso. 

Quando ouvi os tiros, pensei que não fossem reais. 

Desliguei o celular e continuei dirigindo para casa. Eu estava aturdido, confuso e descrente. Cheguei em casa... mas já não era mais o meu lar. A rua estava lacrada. Carros da policia bloqueavam as entradas da rua. Pessoas em uniformes hazmat entravam e saíam da minha casa. Em meu estado confuso, pensei que aquela situação se assemelhava bastante aos filmes REC ou Quarentena. Para ser honesto, eu achava aquela situação muito interessante... até que os vi retirando um corpo coberto por uma lona e percebi, pelo sapato que estava exposto, que aquele era o corpo do meu irmão caçula. 

Então eu dirigi. 

Dirigi até sair da cidade, para bem longe da cidade. Então percebi que seria estupidez continuar dirigindo. Seja o que for que estava acontecendo, eu consegui fugir por pura sorte. Tentaram por uma rede ao nosso redor, mas apenas eu escapei graças às minhas aulas. 

Então, o que estava acontecendo? Já tinha visto muitos filmes de terror para adivinhar. Estou infectado, mas quem diabos sabe com o que estou infectado? Meus pulmões ardem e tem um estranho caroço em minhas costas. Ainda não olhei, mas aposto que tem uma marca vermelha – uma marca vermelha que se assemelha com uma grande picada de mosquito. O que é isso? Vou morrer? Bom, era serio o bastante para terem executado os meus pais, e até o meu irmãozinho. Seja o que for que eu tenha, deve ser uma merda séria. Me pergunto, como isso pode ser transmitido... tosse? Toque? Mordida? 

Descobrirei amanhã. 

Andei até conseguir uma carona, então andei um pouco mais. Parei em um motel, tentei dormir, mas não consegui. Continuava vendo o sapato do meu irmão saindo de baixo daquela lona... o sapato... então abri o notebook e decidi digitar isso. 

Eles tiraram tudo de mim. Eu... vou morrer. Eles não precisavam ter feito o que fizeram. Eles poderiam avisar que éramos um perigo para os outros. Não precisavam atirar em minha mãe... em meu pai… eu vou levar o máximo comigo antes de partir. Amanhã, passarei o dia apertando mãos. Irei ao Mercado e tocarei em todas as comidas – talvez tossir nelas. Irei babar nos bebedouros públicos. Farei o que puder para traze-los comigo. Então, amanhã… por favor. Aperte a minha mão. 

Se alguém te morder, não se preocupe. Não será nada comparado a picada de um inseto.

25 comentários:

  1. Adorei a história :D
    10/10
    Ele vai virar um zumbi?

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  2. Essa parte do "eu vou contaminar todo mundo" se assemelha muito á uma situação crítica que o Brasil estava desenvolvendo quando os doentes queriam nos contaminar...
    Amei a creepy, simplesmente amei.

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    1. Vdd...
      Mas tb é desnecessário ele sair contaminando tudo, ele vai morrer msm kkk
      Vingança desnecessária

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  3. Muito bom! É de autor nacional ou é do nosleep? Gostei do estilo de escrita...

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  4. Foda. Confesso que eu faria o mesmo, ia sair me esfregando em tudo shakfnoanfskkd. Ngm mandou atirarem na mamãe.

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  5. Morri de raiva do narrador o tempo todo, bem feito que tá infectado kk

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  6. Porra
    A mamai já é tenso de aceitar, mas o irmão caçula ):
    10/10 parsero tô feels

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  7. Creepy foda, mas esse narrador é um babaca.

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  8. Que creepy foda! Confesso que eu tomaria a mesma atitude ksksksk

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  9. História legal, mas pequenas coisas na forma como foi escrita poderiam ser melhores. Mas a ideia é bacana.

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  10. Creepy muito boa, muito obrigado pela tradução 10/10 :)

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  11. pior eh q eu to com um caroção de picada de mosquito na minha coxa e.e
    m e d o

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  12. Vim de 2020, período de quarentena no RS, Brasil e no mundo todo. Brasil registrou ontem mais de 100 mil mortes pelo Corona Vírus. Bagulho ta brabo kkkkkk

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