06/04/2015

O Cinegrafista

Nós três sentíamos que o paranormal era uma coisa que estava além. Gostamos de nos ver como pessoas inteligentes, e quando entravamos em discussões sobre o assunto, nos sentíamos invencíveis.

Recentemente, Martin insistiu que deveríamos fuçar o notebook do irmão obeso dele, cheios de documentos e pastas ocultas (e quando ele prometeu algo relacionado á “melhor baseado”), nós três resolvemos nos encontrar com ele no porão da casa de Jon.

Depois de algumas tragadas nós tentamos nos focar no monitor do notebook, clicando em coisas nomeadas de “Demônios”, “Rituais”, “Como fazer rituais”, “Pragas” e “Sonhar acordado”.

Cada pasta era lotada de fotos de figuras pálidas com caras borradas e triangulares e dedos parecidos com asas. Havia também alguns textos e comentários, alguns continham outro tipo de linguagem e símbolos, incluindo símbolos usados em rituais de sacrifício.

Aquilo era bem interessante para três adolescentes chapados.

Nós achamos alguns projetos em uma das pastas, nomeada de “Evocação”; tinha um monte de figuras nela, e diagramas, que diziam chamar coisas diretamente do inferno, ou outras dimensões.

Pelo menos foi isso que eu deduzi quando li “outros”.

Depois de vários minutos rindo nós decidimos escolher um deles e tentar fazer.

O diagrama não exigia muitas coisas; precisaríamos apenas de incensos e algumas palavras ditas, todas em uma linguagem que nenhum de nós havia escutado antes. A entidade que o diagrama descrevia na imagem vivia “sob a parede” (o que não foi muito fácil de ler, pois havia rabiscos vermelhos na foto, e por cima das letras).

Tinha uma explicação de como lidar com a entidade, seus poderes, e algumas histórias sobre as vidas que ela já havia destruído (incluindo uma bem assustadora sobre uma menina que foi encontrada com os órgãos retirados, e outra sobre figuras sem olhos vagando pelo lugar da evocação). A coisa era curiosa, mas impaciente. Gostava de stalkear humanos, analisar, tudo isso antes de ficar mais maliciosa e começar a realmente nos perseguir, experimentar conosco, e até mesmo nos influenciar a fazer coisas para saber aonde chegaríamos.

Nós preparamos tudo e Jon se voluntariou pra ler as palavras, e deixe-me dizer, assistir Jon enquanto ele dizia aquela linguagem estranha foi o ponto alto da noite até o momento. Nós rimos durante todo o processo; Jon tropeçava nas palavras e outras foram completamente ignoradas por causa da risada do mesmo. Até quando o Martin ficou pedindo para que nós ficássemos quietos, as palavras de Jon nos fariam rir de novo.

Foi nesse momento que decidi pegar minha câmera; era uma tradição nossa filmar as sessões do porão, (e quem sabe um dia Jon pudesse concorrer ao Oscar).

Nós meio que ignoramos o notebook assim que comecei a filmar; estávamos ficando entediados e Jon não conseguia pronunciar mais nenhuma palavra. Eventualmente, nós começamos a filmar as paredes e ao redor do porão, falando com a entidade diretamente, meio que fazendo aquela rotação que tinha no The 70’s Show, sabe?

Nós dizíamos algo “inteligente”, “relevante”, ou “engraçado” e então passaríamos a câmera para o próximo. Era interessante documentar as coisas desse jeito, e as risadas no dia seguinte já estariam garantidas...

A noite passou rápido demais depois disso. Eu me lembro de ligar a TV e em algum momento Martin e eu pegamos o notebook e subimos a escada novamente, nem percebemos quando Jon dormiu no sofá...


Na manhã seguinte achei meu celular cheio de ligações e mensagens, todas de Jon. A maioria delas dizia “Traz sua bunda pra cá agora,” e as mensagens de voz, que eu não esperava que fossem diferentes, foram. Uma grande parte estava interrompida ou com chiado, e se por algum momento pensei que ele estivesse chapado, não pensava mais.

Ele dizia: “achei lá embaixo... diversão, você sabe, era pra ser... eu só achei que... eu achei... na câmera... para ver... você precisa ver... era pra ser engraçado... apenas aqui... venha aqui...” Ele soava estranho, praticamente sem vida e fraco, e isso foi algo que fez com que eu me alarmasse.

Então fui atrás do Martin, que também havia recebido várias mensagens de Jon e depois de algum tempo, resolvemos ir até a casa dele.

Nós o encontramos no andar de cima, na sala de TV. Eu esqueci minha câmera lá e ele resolveu olhar o que nós tínhamos gravado, pausando e vendo novamente, parando aqui e ali para olhar mais atentamente. Martin e eu entramos no quarto e sentamos próximo a ele no sofá, não queríamos interromper.

A filmagem estava aberta em uma parte que eu lembrava perfeitamente, e eu assisti enquanto Jon falava as palavras do ritual. Vindo da boca dele, elas pareciam completamente falsas e inventadas, como poemas de outros países. No vídeo, nós estávamos rindo e os sons das nossas risadas abafadas enchiam o quarto. Eu olhei para Martin e depois para Jon.

O quão chapado Jon estava e o quão risonho Martin estava... A sensação de que eu estava vendo algo que não lembrava de ter gravado me atingiu, e me fez pensar que isso era provavelmente algo perdido de ontem á noite.

Eu finalmente perguntei á Jon o que havia acontecido, por que ele havia nos ligado, e quis saber o motivo pelo qual ele parecia tão cansado, e ele me deu uma resposta fria: “Continue assistindo”.

E nós continuamos.

A noite se passava na TV, fazendo-me lembrar de coisas que eu havia esquecido mesmo depois de tão pouco tempo. Chegou um momento em que começamos a falar com a câmera e passar para o próximo, Jon nos encarava como se estivesse pronto para nos estapear a qualquer momento, então, eu não me atrevi a tirar os olhos da TV ou perguntar o que nós estávamos procurando.

Finalmente, no vídeo, o momento de passar a câmera se foi e outro começou, e foi aí que Jon deu pause.

“Viu? Viu? E aí?” Jon disse, alternando o olhar entre mim e Martin, quase acusadamente enquanto nós dois encarávamos a TV.

Por um momento olhei para Martin e ele fez que “não” com a cabeça, na TV, nós estávamos todos sentados no sofá de Jon, ouvindo música alta e balançando as cabeças loucamente, obviamente chapados e ignorando a câmera.

Eu encarei a imagem por alguns segundos sem entender, mas quando percebi, me atingiu como um trem. Eu soube o porquê de Jon ter nos chamado, e me fez ficar enjoado.

Jon disse antes que eu pudesse falar algo: “Quem diabos está segurando a câmera?”



14 comentários:

  1. SENSACIONAL, o melhor tipo de creepy é aquele que voce le pensando algo, e do nada BAM, é atingido por algo totalmente inesperado que justifica toda a historia, nota 10

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  2. EEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEITA! MUITO boa essa creepy! 10/10

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  3. Era só o irmão obeso do carinha 🌞

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  4. "vive sob a parede" "encontrado sem os olhos" , Zalgo, é você?
    He is coming...
    He who waits behind the wall
    He who waits to end it all...
    All that you know, all that you are
    He will tear it appart and leave you affar
    He will call on the beast to devour your soul
    He will take the whole world and make it unwhole
    He comes.....

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  5. "vive sob a parede" "encontrado sem os olhos" , Zalgo, é você?
    He is coming...
    He who waits behind the wall
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